domingo, 4 de março de 2007

Breve ensaio sobre a cegueira

Por que indignação? A cegueira da fé insensata sempre conduz a caminhos errôneos. E é esta a paisagem que se desenha no debate aberto pelo senhor Walmor Macarini, quando da publicação de seu texto “O apego dos fanáticos”. O caro jornalista apontava para um dos caminhos a serem seguidos diante de um mundo cada vez mais individualizado e egoísta, no qual o homem se sente confuso e perdido. Não concordo com o colega quando o mesmo diz que a perda da fé causou isto; esse é um processo bem mais complexo, no qual, aos poucos, o homem foi sendo privado do entendimento do funcionamento do mundo, e perdeu a capacidade de modificá-lo, passando a ser quase um mero espectador.
Da época da Revolução Industrial, notamos que o trabalhador vai perdendo o controle sobre o processo de produção e torna-se apenas operário, aquele que opera a máquina cujo produto final agora desconhece na totalidade. Em um mundo gerido pela necessidade de produção e eficiência, é importante ressaltarmos também este alijamento.
No entanto, o corporativismo da fé do senhor padre, que se mostrou indignado em sua publicação no último dia 27 de fevereiro, nos mostra que a Igreja católica ainda pretende manter sua posição de intérprete final do ensinamento de Jesus. Como o sr. Bedrowski mesmo citou, segundo o evangelho de João, Jesus diz que ninguém vai ao Pai senão por ele, ou seja, através do entendimento de seu exemplo e de sua divindade, mas não estabelece o monopólio da crença na Igreja católica.
Lutero já havia afirmado que o homem é o sacerdote universal, ou seja, que pode ele mesmo ser seu sacerdote; ele mesmo possui o dom de interpretar e buscar as respostas mediante seu estudo e seu entendimento. Acredito também que, quando se anuncia a revisita de Jesus, é enquanto princípio, ou seja, quando o homem for capaz de desenvolver aquela centelha divina que carrega, então o momento do retorno do Cristo será confirmado. No entanto, a cegueira da fé insensata nos diz que há somente um abrigo, o do conforto da Igreja, com seus ministros infalíveis, e que não suportam a crítica e a opinião diversa.
Novas discussões se abrem com o anúncio da descoberta de uma suposta tumba com os restos mortais de Jesus e Maria Madalena. Haveria nisso alguma verdade? Talvez, uma vez que deveríamos diferenciar o Jesus histórico, o pregador que lutou contra a opressão dos sacerdotes judeus, e o Jesus princípio, aquele no qual o homem deve se espelhar e organizar sua vida. Mas, uma vez mais, veremos os brados furiosos dos entorpecidos pelo veneno da irrazão e do poder, para os quais há somente uma verdade.



Publicado na Folha de Londrina, no dia 01 de Março de 2007